Resenha de "O Amante Japonês" (Isabel Allende)

Título: O Amante Japonês
Autor: Isabel Allende
Editora: Bertrand Brasil (Cedido em Parceria)
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Sinopse: Uma paixão secreta que perdurou por quase setenta anos. Em 1939, ano da ocupação da Polônia pelos nazistas, Alma Mendel, de oito anos, é enviada pelos pais para viver em segurança com os tios em São Francisco. Lá, ela conhece Ichimei Fukuda, filho do jardineiro japonês da família. Despercebido por todos ao redor, um caso de amor começa a florescer. Depois do ataque a Pearl Harbor, no entanto, os dois são cruelmente separados. Décadas depois, presentes e cartas misteriosos são descobertos trazendo à tona uma paixão secreta que perdurou por quase setenta anos. Varrendo através do tempo e abrangendo diferentes gerações e continentes, 'O amante japonês' explora questões de identidade, abandono, redenção, e o impacto incognoscível do destino em nossas vidas.

Não é fácil um autor conseguir fazer com que pouco mais de 200 páginas fale sobre uma geração inteira de uma família. Normalmente livros desse tipo tem pra lá de 500, para que o próprio autor se sinta feliz por ter narrado bem cada um dos personagens. Não foi o caso da Allende nesse livro. Apesar de ser uma autora que destrincha bem sua narrativa familiar em livros grandes também - veja o caso de A Casa dos Espíritos - com O Amante Japonês ela parece ter conseguido a proeza de nos fazer sentir absurdamente e nos apegar a personagens complexos usando pouquíssimas páginas. 

É meio complicado explicar a linha da trama dessa história, mas vou tentar. 
Temos Irina, que consegue emprego em uma casa de idosos e logo se torna uma das melhores funcionárias do lugar, sendo notada pela poderosa Alma Mendel, uma senhora fechada e rica por demais da conta. Irina logo se torna a secretária particular de Alma, conhecendo seu neto, Seth, que está escrevendo uma biografia da avó, e se aproximando do rapaz para tentar entender melhor sobre o passado de Alma, e alguns segredos que ela parece esconder bem, como é o caso de Ichimei, um ex amor de sua vida que pouca gente sabe que existiu. 

Pode-se dizer que a história é sobre essas duas mulheres. Com a narrativa alternando entre o passado e presente, principalmente de Alma, que viveu os horrores da guerra mesmo que à distância, e que foi moldada pelos tios com uma maneira bastante comum para as moças da época. Essa criação acabou fazendo com que certas escolhas de sua vida tivessem sido um pouco racionais demais, e que depois da velhice a fizesse pensar no "se tivesse feito de outra forma e colocado as diferenças de lado, onde será que estaria?". 

O presente de ambas nos mostra os laços afetivos que elas fazem uma com a outra, como também com as pessoas ao redor. O fato de Alma morar em uma casa de idosos nos coloca para pensar em muitos momentos sobre as nuances da vida, e nos coloca para ver a morte de uma maneira até bastante positiva. Os diálogos entre elas, e delas com outros personagens, são carregados de significado, apesar de leves em muitos momentos. Uma prova do poder da escrita de Allende. 

A autora também nos brinda com uma carga de conhecimento histórico fascinante. Eu por exemplo não sabia a que tipo de descriminações os japonês tinham sofrido nos EUA depois do ataque a Pearl Harbor. Não chegou a ser nada como Hitler e os judeus, mas chegou próximo a isso na questão de liberdade. Foram as partes do livro que mais me envolvi, e acredito que por ser justamente um fato histórico que desconhecia, porque normalmente os livros são narrados pelos vencedores. 

As personagens principais tem força na trama, mas acho que elas na verdade são mais os fios condutores que nos leva a entender o poder que a trama em si tem ali dentro. Como se a história de ambas fosse um personagem a parte. O mais poderoso deles. 

As problemáticas conflituosas da vida amorosa de Alma irritam ao mesmo tempo que são elegantes e bem escritas. Não me incomodou o fato dela ter tido dois amores em toda a sua vida, e ter a plena consciência de amá-los ao mesmo tempo, porque ambos supriam coisas diferentes para ela. Não via como traição, apesar de ser, mas como um certo tipo de alívio para a rotina e uma solidão crescente e interna. 

Eu demorei um bocado para terminar esse livro. Não por ser difícil ou ruim, longe disso, mas é o tipo de livro que precisa ser tragado aos poucos. Ele tem uma substância poderosa, e não dá simplesmente para passar as páginas sem pensar nessas pequenas partículas de poder que a autora vai jogando devagar no meio da história. 

Uma bela leitura, certamente. Uma aula de história em vários aspectos. Indico de verdade para quem gosta de livros mais lentos e com uma pegada histórica forte.